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FOCO & POSICIONAMENTO

Decidimos focar a agência no segmento das mídias out-of-home[1]. Avaliamos que a especialização seria a solução para a complexidade do meio. Um ano depois, quando ainda patinávamos em incertezas e angústias, foi aberta uma licitação pública relevante para o setor. O acaso nos ajudou. Meses antes havíamos conhecido um executivo de um grupo de comunicação norte-americano com interesse em atuar na América do Sul. Feitos os contatos, apresentadas as idéias e aceitas as propostas, os contratos foram assinados. Onze meses depois vencemos a licitação, e nossa aposta duvidosa se mostrava uma realidade vitoriosa.
No início dos anos 70, o discurso de marquetim tinha que atender aos desejos expansionistas norte-americanos. A moda era redefinir negócios de um modo que aumentasse a abrangência do mercado. Um “causo” contado em sala de aula na FEAUSP[2] foi o da FEDEX que ao olhar para seus navios, aviões, trens e utilitários, se redefinira como “empresa de transportes” ampliando os limites originais do negócio de entrega de encomendas. Ela poderia até transportar gente. “Gente, que sacada!!!!” Aproveitando o mote,  pense e responda: uma empresa focada em um determinado segmento deve mudar de foco se crescer?
Outras modas passaram: re-engenharia, centralização, descentralização, identificação do core business[3], terceirização, foco no Cliente, foco no produto, pós-venda etc. Paralelamente os avanços na computação e nas telecomunicações proporcionando informação em tempo real, provocaram mudanças em todos os segmentos de atividade, em uns mais, outros menos.
Parênteses. Sempre identifiquei um elitismo educacional incompatível com nossa realidade. As universidades, os livros de administração, de marquetim, as revistas especializadas nesses temas, todos parecem ter compromisso com o glamour, e não em formar seus alunos ou contribuir com as experiências de seus leitores. O conteúdo teórico e prático das matérias tem como referencial as grandes corporações. Os exemplos dados são sempre os de empresas multinacionais como Microsoft, Apple, Facebook, Google, Unilever, P&G etc. enquanto que a futura realidade dos jovens seria muito melhor preparada se aprendessem porque o seu Manuel da padaria nunca sai de trás do balcão, dia após dia, ano após ano, sem nunca tirar férias. Recentemente, compartilhando mesa com estranhos em restaurante a quilo, sentei com dois professores da UFRJ. Na conversa, disse um deles: “(...) os novos professores não são como nós, que também trabalham em uma empresa real. Os alunos de hoje se formam menos preparados por causa da falta de experiência prática do corpo docente”. Não estou sozinho na idéia! Por que não temos uma faculdade de “Empreendedorismo e Pequenos Negócios”?[4] Por que não oferecer conteúdo mais próximo e mais coerente com a realidade brasileira? Por que tão pouca informação útil ao que será a realidade de fazer vingar um pequeno negócio? Nas palavras de um jovem desses: “Cursar Administração foi tempo perdido. Nada que aprendi me serviu neste meu negócio. Nada do que precisava saber aprendi na faculdade”.
O aumento do poder de processar e acumular conhecimento trouxe duas outras questões:
1.      A competição tem um ciclo menor. Ganhos e perdas são mais rapidamente definidos porque as batalhas são mais intensas e duram menos tempo. Novos competidores surgem por minuto porque o acesso ao conhecimento básico está disponível a qualquer um, em qualquer lugar. Todo mundo se acha capaz de fazer qualquer coisa. Não à toa os consumidores estão tão insatisfeitos com o que recebem.
2.      O aumento do volume das informações e a velocidade em que nos chega, trouxe complexidade ao processo de transformá-las em conhecimento de valor. Para superar esta barreira, não há outro caminho se não o da especialização.
Neste início de século XXI, a idéia de aumentar lucros aplicando um determinado conhecimento ao maior número possível de atividades não funciona. Hoje, o mais adequado ao desejo dos consumidores é a estratégia de foco em um mercado ou segmento de mercado. Quanto mais concentrado, maiores são suas chances de sucesso. Quanto menos capaz de se manter up to dated[5], mais risco Você corre de ser superado.
Especialização é foco, mas foco não é especialização. Foco é aquilo que Sabichão escolhe como núcleo do seu negócio. Foco não quer dizer que Desavisado só trabalhe com um ou dois itens, uma ou duas categorias de produto, um ou dois fornecedores. Não. Foco é aquilo a que damos mais atenção e não necessariamente incorpora todos os diferenciais que temos. Prazo de pagamento, por exemplo, pode ser um diferencial, mas pode não fazer parte de seu foco. Seu foco pode até mesmo ser vender a vista, tendo prazo como diferencial se os concorrentes não oferecem essa alternativa.
Às vezes Desavisado não sabe o que quer, mas Sabichão sabe o que não quer. Uma estratégia para definir seu foco é identificar o que não quer. Que categorias de produto não quer vender; e/ou que tipo de consumidor não quer como Cliente. Na internete, num texto que explicava as diferenças entre lan house[6] e cyber cafe[7], chamando a atenção para o conflito que as duas atividades geram se estiverem no mesmo espaço, encontrei isto: “O perfil dos clientes de lans (jovens) e de cybers (adultos) não se misturam porque não suportam conviver num mesmo ambiente”. É um caso típico onde a pergunta a fazer é: para qual tipo de consumidor Você não quer trabalhar?.
Manter o foco implica em custos específicos. Na indústria, exige capacidade de investimento constante. No comércio, exige um contínuo de atualização. E na prestação de serviços, excelência. Mas manter o foco significa custos totais menores, maior poder de comercialização, maior agilidade e eficiência, ganho marginal e comunicação mais eficaz. Mantenha o foco e só incorpore novidades que agreguem ganho efetivo. Aprimore, mas evite sair dos trilhos.
Já posicionamento é a diferenciação sintetizada. Nada mais do que isso. Vejamos o caso de meu filho, Desavisado, que abriu uma papelaria num shopping mal terminado de construir, numa localidade de características muito peculiares quanto a comportamento de consumo, sem loja âncora instalada... Para este ambiente indefinido usou a estratégia de diversificar para “ver o que acontece”. Tendo como núcleo os itens básicos de papelaria, adicionou produtos eletrônicos; bichos de pelúcia; micro para acesso a internete; fax; copiadora; geladeira expositora com refrigerantes e doces gelados; e expositor de salgados ao lado de um forninho elétrico. Sabichão irá apontar falta de foco. Com razão, mas por pouco tempo. Nada que uma boa solução para posicionamento não resolva. Ao receber o desafio, identifiquei duas coisas: uma papelaria, sim, mas diferente porque teria computador para o Cliente usar; diferente porque, além de papel, também teria coisas gostosas. Aí ficou fácil definir o posicionamento. Ficou assim: “A papelaria diferente e gostosa”.  A vantagem adicional de um bom posicionamento é ser uma valiosa arma de defesa contra a entrada de novos concorrentes. No nosso caso, se o posicionamento se mostrar eficaz, qualquer novo competidor vai encontrar ocupada a gaveta “papelaria diferente”.
Conselho:
Foco e posicionamento, a dupla que torna o caminho menos árduo.





[1] Termo usado pelos norte-americanos para referenciar todas as alternativas que possibilitam a exposição de publicidade em ambientes abertos ou fechados, públicos ou privados, desde que não seja a casa das pessoas.
[2] FEAUSP: Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo.
[3] Do inglês, significa aquilo que é a atividade principal da empresa, aquela que não pode ser terceirizada.
[4] Às vésperas de autorizar a impressão, eis que recebo um spam (mensagem não-solicitada), da Universidade do Sul de Santa Catarina, anunciando o curso Gestão de Micro e Pequenas Empresas. É um curso de graduação a distância de 2 anos, o que não é lá muita coisa, mas já é alguma coisa.
[5] Up to dated, expressão da língua inglesa que significa estar  atualizado com o que há de mais moderno.
[6] Lan house, expressão da língua inglesa. Lan, é sigla de Local Area Network. A expressão designa um local onde existem vários computadores conectados em rede, permitindo que várias pessoas joguem simultaneamente um mesmo jogo.
[7] Cyber Cafe, expressão da língua inglesa que designa um ambiente de cafeteria ou lanchonete, onde existem computadores que permitem ao cliente acessar a internet, mandar e-mails etc.



CONCORRÊNCIA & DIFERENCIAÇÃO
Não sei como começou e também não importa. Uma fábrica de móveis, de porte considerável, que há mais de 20 anos tem um único grande Cliente. Certo dia, conversando com o dono, indaguei sobre os riscos desta situação de dependência. Ele não se mostrou nem um pouco preocupado. De algum modo ele tinha criado um monopólio. A situação permanece, contrariando bom senso e conceitos de marquetim.
O sonho inconfesso de todo empresário é ter seu próprio monopólio. Infelizmente, isso não recebe a concordância de potenciais competidores, mas tenho a descarada pretensão de dizer que tenho a fórmula mágica. E vou revelá-la aqui. Espero que ela ajude a fazer valer o que Você pagou por este livro. Por enquanto, vamos tratar concorrência como uma condição imposta pelo mercado.
Se a concorrência é inevitável, não siga o conselho de dona Marta, “relaxe e goze”. Melhor é aguçar sua percepção. Identifique seus concorrentes diretos e indiretos (supermercado é concorrente de quase todo tipo de comércio) e descubra seus pontos fortes e fracos. Em relação a tudo: localização, mix[1] de produtos, política de preços e descontos, agilidade em promoções, aparência da loja, postura de vendedores, disposição dos produtos, etc. Faça o mesmo em relação a seu negócio. Com uma diferença: seja generoso com os concorrentes e exigente com Você. Feito isto, escolha os diferenciais que o ajudarão a ser bem-sucedido.
Não precisamos de um medidor de energia despendida (física e mental) para sabermos que o gasto é o mesmo, tanto para ser igual quanto para ser melhor que o(s) concorrente(s). Então, seja diferente. O risco é sempre menor do que ser igual. Quando Você é diferente, fica muito mais fácil ser percebido. Sabichão, eu sei que Você sabe disso! Desavisado, eu sei que Você já esqueceu disso! É claro que sua diferenciação pode não cair no gosto do povo. Mas ainda assim será melhor, porque ser diferente é dar uma razão para o Cliente optar por Você. Nada contra quem gosta de rezar todo dia ao se levantar, mas depois do “Amém”, se pergunte: “por que clientes virão a mim hoje?”.
Ser diferente não é oferecer o que seu concorrente não oferece. É oferecer o que seus concorrentes não podem oferecer. Por que não podem?
1.      Porque não têm espaço.
2.      Porque o investimento necessário para mudar é grande e eles não têm reservas de capital para realizar as mudanças.
3.      Porque não estão dispostos a arriscar a posição duramente conquistada.
4.      Porque não têm capacitação para tal.
5.      Porque não têm vantagens que Você tem (conhecimento de informática, bom crédito com fornecedores; etc.).
6.      Porque afetaria a percepção que os clientes já têm deles.
7.      Porque o orgulho não lhes permite mudar para o modelo do concorrente, e o orgulho é uma... “merda”.
8.      Porque mudar também é... “uma merda”.
Diferenciar não é nem mesmo tentar identificar o que o mercado está querendo, simplesmente porque nenhuma pesquisa prévia, dissociada da experiência, irá lhe dizer isso. Só o dia-a-dia é capaz de lhe indicar ajustes no caminho. Aqui vale o dito “o caminho se faz caminhando".
Diferenciar, portanto, é identificar aquilo que Você pode e os outros não podem. E como prometi no início do capítulo, aqui vai o segredo: diferenciar é a fórmula de criar seu próprio monopólio. Não seja sem-vergonha, mas seja diferente e um desavergonhado monopolista!
Conselho:
Seja diferente. Crie seu próprio nicho de mercado.






[1] Mix, palavra da lígua inglesa. Usa-se “mix de produtos” (ou serviços) para designar o conjunto de tipos de produtos (serviços) que a empresa oferece.

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